Lídia Guerreiro Jorge nasceu no Algarve, em Boliqueime, a 18 de junho de 1946 e é consensualmente considerada um dos nomes mais destacados da literatura portuguesa das últimas décadas, em especial pela sua produção ficcional.
Estudou na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, onde se licenciou em Filologia Românica. Depois disso, Lídia Jorge foi professora do Ensino Secundário e viveu em África (Angola e Moçambique), ainda durante a guerra colonial. O seu primeiro romance, O dia dos prodígios (1980) revelou-a como ficcionista dotada de um talento efabulatório amplamente confirmado nas obras seguintes, o que lhe valeu inúmeros e importantes prémios literários. Na sequência daquele romance, escreveu e publicou O Cais das Merendas (1982) e Notícia da cidade silvestre (1884).
Autora de uma obra abundante e ainda em desenvolvimento, Lídia Jorge afirmou-se em função de diversas linhas temáticas. Avultam dentre esses veios temáticos, eventualmente de forma conjugada, a literatura centrada na guerra colonial e nas suas sequelas ideológicas pós-coloniais e, por outro lado, o advento (muito forte desde os anos 70) de uma temática e de uma configuração discursiva feminina. De um modo geral, pode afirmar-se que o conjunto da obra de Lídia Jorge, constituindo uma das mais consequentes produções ficcionais da literatura portuguesa na passagem do século XX para o XXI, não pode ser espartilhado numa única linha evolutiva; traduz-se nela o diálogo intenso, não raro de índole crítica, com o Portugal que vive a mudança do século sob o signo de transformações sociais e mentais às vezes aceleradamente incorporadas no viver coletivo. Os resquícios da memória colonial, as agruras de um redimensionamento nacional pós-imperial, a “europeização” dos modos de vida, as obsessões da “modernização”, as bruscas modificações de comportamentos às vezes seculares, as repercussões mentais e sociais de movimentos migratórios, as constrições e contradições de quotidianos “normalizados”, a transformação do papel da mulher e da sua mentalidade, as práticas de exclusão social, a subversão das linguagens com crescente influxo da civilização da imagem são algumas das questões que a ficção de Lídia Jorge integra no seu universo ficcional. Assume especial relevância a representação de comunidades rurais de certa forma marginalizadas, em confronto com práticas sociais e culturais urbanas e pós-industriais, conforme pode ler-se em O dia dos prodígios e em O Cais das Merendas, também sob o signo de derivas para o fantástico. Em Notícia da cidade silvestre, Lídia Jorge recupera uma visão realista e mais prosaica da condição da mulher em cenário urbano, o que atesta também o potencial de diversidade da sua ficção, sempre muita marcada pela tematização do feminino que reaparece em A última Dona (1992) e em O vento assobiando nas gruas (2002), romance em que convergem também temas e figuras de inspiração pós-colonial. Relevante na obra de Lídia Jorge é o tema da guerra colonial, em conjugação com a problematização da condição da mulher; assim, em A Costa dos Murmúrios (1988), não está em causa apenas a guerra colonial, em si mesma e na sua violência, mas também a sua projeção no imaginário feminino, nas reações que nele se observam e no desgaste de ilusões imperiais consumidas pela erosão da História.
Outros títulos que merecem destaque na bibliografia de Lídia Jorge: Combateremos a sombra (2007), A noite das mulheres cantoras (2011), Os memoráveis (2014) e Estuário (2018), bem como volumes de contos (A Instrumentalina, 1992, Marido e outros contos, O amor em Lobito Bay, 2016, entre outros), de literatura infantil, de teatro (A Maçon, 1997, Instruções para voar, 2016), de poesia (O livro das tréguas, 2019) e de ensaio (Contrato sentimental, 2009).
Personagens no Dicionário:
Carminha (O dia dos prodígios)
Carminha Rosa (O dia dos prodígios)
Eva Lopo (A costa dos murmúrios)
Helena de Tróia (A costa dos murmúrios)
Milene (O vento assobiando nas gruas)