1. Título
O título Dicionário de Personagens da Ficção Portuguesa (Dicionário, a partir de agora) designa um campo de descrição que adiante será especificado. A ficção portuguesa é, neste contexto, a ficção narrativa e sobretudo a ficção narrativa literária, ou seja, o romance, a novela e o conto. Ficam, assim, fora do âmbito do Dicionário as personagens dramáticas propriamente ditas, mas considera-se pertinente incluir no corpus personagens de épocas e de géneros anteriores ao romantismo (renascimento, barroco, neoclassicismo, etc.; epopeia, novela de cavalaria, novela pastoril, etc.).
Não se exclui a possibilidade de, noutro momento, se conferir ao título do Dicionário um conteúdo mais alargado, visando outras literaturas de língua portuguesa (p. ex.; Dicionário de Personagens das Literaturas de Língua Portuguesa) .
Este é, por conseguinte, um projeto em desenvolvimento.
2. Dimensão e alcance
O Dicionário é entendido como resultado extensivo do projeto “Figuras da Ficção”. Nesse contexto, o Dicionário é concebido como uma obra articulada sobre quatro linhas de desenvolvimento:
- a personagem, enquanto categoria narrativa com reconhecido potencial semântico e diversificada elaboração, em várias épocas e géneros narrativos;
- a literatura portuguesa, enquanto campo literário que corresponde ao que é usual designar como literatura nacional e determinando o fundamental do corpus de entradas;
- a história literária, enquanto processo que envolve transformações que incidem sobre a categoria narrativa aqui em causa, designadamente (mas não só) no que toca ao devir de movimentos periodológicos;
- os estudos narrativos, enquanto campo teórico alargado e interdisciplinarmente enriquecido por extensões que conduzem a narrativas não literárias e não verbais (cinema, jornalismo, televisão, banda desenhada, videogames, etc.), contempladas na medida em que ilustram a sobrevida da personagem literária noutros contextos e suportes, com destaque para a questão da transposição intermediática.
Para a sustentada fixação do âmbito de alcance do Dicionário contribuirá um circunstanciado texto de introdução, que servirá ainda de atualização teórica do conceito de personagem e dos que lhe são correlatos (figura, figuração, etc.).
Para além disso e ainda em termos genéricos, o Dicionário incidirá prioritariamente sobre personagens da ficção narrativa portuguesa (p. ex., Joaninha, Eurico, Simão Botelho, João Semana, João da Ega, Malhadinhas, Álvaro Silvestre, Palma Bravo, Blimunda, etc.); para uma eventual versão alargada ficam os tipos com representatividade na literatura portuguesa (p. ex., o guerreiro, o brasileiro, o escritor, o jornalista, etc.). O Dicionário acolherá ainda, enquanto conceitos a tratar como entradas autónomas, géneros e subgéneros narrativos (p. ex.: romance, romance histórico, novela sentimental, crónica, etc.); nestas entradas, serão valorizadas personagens com menor visibilidade e fortuna crítica, assim se compensando a sua ausência enquanto “entradas” individualizadas. As remissões dinamizarão os movimentos de interação que assim ficam previstos, entre géneros (e subgéneros) narrativos e personagens.
Sem prejuízo do que ficou dito acima, o elenco de autores e de textos de onde sairá a parte mais substancial do repertório de personagens situar-se-á predominantemente no arco cronológico que vai do século XIX à atualidade. Um tal arco cronológico traduz o reconhecimento de que, nele e nos diversos movimentos literários que o preenchem, a personagem ganha densidade própria; trata-se do tempo de maturação e de consolidação do romance, como género narrativo em que se aprofundam as virtualidades semântico-pragmáticas da personagem.
O Dicionário não se limitará a ser uma obra com alcance meramente descritivo; ele privilegiará uma dimensão exegética, com certo índice de problematização das matérias contempladas. Decorre daqui a conveniência de ser constituído um corpus “seleto”, mais do que extensivo.