José Augusto Neves Cardoso Pires nasceu a 2 de outubro de 1925, em São João do Peso, concelho de Vila de Rei, e viveu em Lisboa quase toda a sua vida. Morreu a 26 de outubro de 1998. Tendo frequentado o curso de Matemática, que não chegou a concluir, dedicou-se depois a diversas atividades profissionais: praticante de piloto na Marinha Mercante, intérprete, jornalista, tradutor e editor.
Como escritor, José Cardoso Pires pertence à geração de Augusto Abelaira e de Urbano Tavares Rodrigues, ou seja, aquela que, na década de 50, procura alargar e renovar as referências temáticas do neorrealismo, sem rutura com ele. Os primeiros livros de Cardoso Pires surgem no fim da década de 40 e na de 50: as coletâneas Os caminheiros e outros contos (1949) e Histórias de amor (1952) e a novela O anjo ancorado (1958). Revela-se, nestes três títulos de um escritor ainda em formação, um registo narrativo escorreito, por vezes linear, sem paternalismos ideológicos e fazendo intervir no processo de escrita uma cultura literária em que o cinema e alguma literatura anglo-saxónica são referências destacadas.
Depois disso e já nos anos 60, José Cardoso Pires situa-se no limiar daquilo a que hoje chamamos ficção pós-modernista. Com O Delfim (1968), afirma-se um dos romances mais talentosos e inovadores de toda a ficção portuguesa do século XX, um relato em que convergem a receção da despojada short-story norte-americana, a linguagem do relato policial e a representação visualista própria da narrativa cinematográfica. A par disso, descreve-se n’O Delfim um mundo machista insensível a um feminino que se ia autonomizando, num tempo em que os mitos do marialvismo pareciam cada vez mais obsoletos. É a esse mundo que pertencem as personagens Tomás Manuel da Palma Bravo e Maria das Mercês, que pudemos rever numa adaptação ao cinema, em 2002, com realização de Fernando Lopes, sobre argumento de Vasco Pulido Valente.
Para além disso, a ficção de Cardoso Pires, em especial a dos anos 60, surge num tempo atravessado por desafios e por dúvidas, por entre transformações sociais e repressões políticas e ideológicas. A peça de teatro O render dos heróis (1960), o romance O hóspede de Job (1963) e a “fábula” satírica Dinossauro Excelentíssimo (1972, com ilustrações de João Abel Manta) são algumas das respostas que o escritor elabora àqueles desafios e dúvidas, em atitude fortemente crítica para com o tempo e o regime de ditadura em que o Portugal de então vivia.
Outros títulos, além dos já mencionados: Cartilha do Marialva (1960), O burro-em-pé (1979), Corpo-delito na sala de espelhos (1980), Alexandra Alpha (1987), A República dos corvos (1988), A cavalo no Diabo (1994), De profundis, valsa lenta (1997), Lisboa – livro de bordo (1999). Uma referência especial a Balada da praia dos Cães (1982), romance que conheceu um considerável êxito de público e uma adaptação ao cinema, por Fonseca e Costa, em 1987: trata-se da reconstituição de um crime político (o assassinato do capitão Almeida Santos pela polícia política de Salazar) que a ficção retoma, conjugando as estratégias discursivas do relato policial, do relatório e mesmo, a espaços, do discurso de imprensa.
Personagens no Dicionário:
Capitão Gallagher (O hóspede de Job)
Elias Santana (Balada da praia dos Cães)
Imperador (Dinossauro Excelentíssimo)
João Portela (O hóspede de Job)
Luís Dantas Castro (Balada da praia dos Cães)
Maria das Mercês Palma Bravo (O Delfim)
Mena Ataíde (Balada da praia dos Cães)
Tomás Manuel da Palma Bravo (O Delfim)