Natural de Lisboa, Manuel Joaquim Pinheiro Chagas ingressa no Colégio Militar e vem a frequentar a Escola do Exército, seguindo a carreira das Armas. Porém, é nas Letras que encontra a via que lhe permite pôr a render o seu espírito polifacetado (e fatalmente desigual), seja como romancista, dramaturgo e poeta, seja na qualidade de tradutor, crítico literário, polemista, historiador e professor de Literatura. Na verdade, segundo Ramos de Almeida, “a figura literária de Manuel Pinheiro Chagas surge-nos hoje deploravelmente diminuída e por mais boa vontade que se tenha ninguém com seriedade a poderia redimir” (Almeida, 1947: 583).
A sua presença na história literária portuguesa fica, no entanto, especialmente marcada por dois aspetos: (i) a produção de algumas obras ficcionais (Tristezas à beira-mar, de 1866 e A Mantilha de Beatriz, de 1878) e dramáticas (A Morgadinha de Valflor, de 1869) que se revelaram autênticos best-sellers na época; (ii) a publicação, em 1865, d’ O Poema da Mocidade seguido de O anjo do lar, uma acha na polémica ateada pelo poema D. Jaime de Tomás Ribeiro, que oporá os partidários da “Escola do Elogio Mútuo”, conduzida por A. Feliciano de Castilho, e os jovens de Coimbra (Eça de Queirós, Antero de Quental, Teófilo Braga). Nesse braço de ferro com os protagonistas da «Questão Coimbrã», o discípulo de Castilho alcança uma vitória relativa (torna-se professor de Literatura Moderna no Curso Superior de Letras) e perde uma batalha importante: a que defende os arrebiques formais e a arte pela arte, sem um ideal nem uma centelha de verdade que a sustente.
É legítima a posição de Irwin Stern segundo a qual “Eça de Queirós e Chagas representavam «duas faces da mesma realidade»: a realidade portuguesa do último quartel do século XIX. Pinheiro Chagas defendia, o protótipo do chauvinista, louvava retoricamente o Portugal antigo e defendia o status quo nacional, enquanto Eça, ousado crítico quer do Portugal passado quer do contemporâneo, respondia (...) exigindo-lhe que reconhecesse a triste realidade nacional” (Stern, 1980: 73).
Autor de uma obra vasta, que denuncia mais a sua propensão para a escrita torrencial e às vezes apressada do que o talento nato, Chagas é considerado por Castelo Branco Chaves “um folhetinista de motivos históricos ou pretensamente históricos” e não tanto um verdadeiro cultor do romance histórico (Chaves, 1979: 65). Basta lembrar títulos como A Corte de D. João V (1867), A Máscara vermelha seguido de O juramento da duquesa (1874) ou A descoberta da Índia contada por um marinheiro (1890).
A Mantilha de Beatriz (1878) que teve um êxito retumbante e foi adaptada ao cinema (1946), pela mão do realizador Eduardo García Maroto, é um exercício metaliterário, que segue de perto a peça Antes que todo es mi dama, de Calderón de la Barca, como sublinha Martínez (2007: 347-370), e que colhe elementos das personagens femininas esquissadas pelo ilustre dramaturgo castelhano para compor a protagonista do seu romance – D. Beatriz de Mascarenhas.
Como já foi dito, Pinheiro Chagas publicou muito e sobre os mais variados temas. Entre a sua obra de crítica literária, salientem-se os Ensaios Críticos (1866), Novos Ensaios (1867), Portugueses Ilustres (1869); no domínio da historiografia, uma História de Portugal em 8 volumes (1869-1874).
Referências:
Almeida, António Ramos de (1947). "Pinheiro Chagas" In: Simões, João Gaspar, Perspetiva da Literatura Portuguesa no século XIX, Lisboa, Ática, vol. I.
Chaves, Castelo Branco (1979). O Romance Histórico no Romantismo Português, Lisboa: ICP.
Nícolas Martínez, Pilar (2007). "A mantilha de Beatriz: Una adaptación portuguesa de la comedia calderoniana Antes que todo es mi dama", Península: Revista de Estudos Ibéricos, n.º 4. 347-370.
Stern, Irwin (1980). "Eça de Queirós versus Pinheiro Chagas", Colóquio / Letras, Notas e Comentários, n.º 55, maio de 1980. 72-75.
Personagem no Dicionário:
Beatriz (A Mantilha de Beatriz)