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João Pinto de Azevedo Meirelles

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Autor: Capa de edição Quetzal

João Pinto de Azevedo Meirelles (Mário Cláudio, A Quinta das Virtudes)

João Pinto de Azevedo Meirelles é uma das personagens principais do romance A Quinta das Virtudes (1990), narrativa que relata a história da construção da Casa, da Quinta e do Passeio das Virtudes, propriedade dos avoengos paternos de Mário Cláudio.

Como se pode ler ainda antes do começo do romance, na árvore genealógica dos Pinto Meirelles, a personagem nasceu em 1819 e morreu em 1886.

Filho de João Manuel Pinto de Azevedo Meirelles e de Teresa de Jesus Teixeira, a personagem é fruto de uma relação que causou discórdia na família, levando a uma cisão entre os da Casa das Virtudes. Por isso, ao invés de nascer na casa da família paterna, João Pinto de Azevedo Meirelles viria a nascer na Rua do Calvário, residência da sua mãe, que fora empregada de servir na casa dos Pinto Meirelles.

Órfão de pai desde tenra idade, João seria criado pela mãe, “fêmea campestre, cuja vaidade da própria beleza física chegara ao extremo.” (Cláudio, 2009: 227).

No que diz respeito aos mecanismos retórico-discursivos da figuração da personagem, poucos são os traços físicos de que dispomos, a não ser a beleza herdada da mãe e aquilo que será vaticinado por uma cartomante: “nem muito comprido, nem muito curto, com um quisto, no cachaço, do tamanho de um ovito de pardal, e será génio…” (229).

Sabemos, no entanto, estar perante uma personagem com densidade humana e complexidade psicológica, na medida em que vive dividida entre a lealdade que deve à vida citadina e janota, por um lado, e, por outro, à vida do campo mais agreste e rude: “Não decidi, até hoje, para que lado me inclinar, se para o da enxada, se para o da espada (…), ora me chamam os dois, ora não escuto a voz de nenhum deles” (228).

A personagem irá desenvolver, desde jovem, um certo culto do romantismo no imaginário, nas ambiências e no modo de viver e de sentir. Para além de folhear “versos de Chateaubriand” (228), João Pinto de Azevedo Meirelles passava os dias da juventude no “Botequim das hortas” entre “uma partida de bilhar (…) entremeada com golinhos de licor escarchado.” Além disso, começava a ganhar fama de janota na cidade do Porto, devido à sua vestimenta: “calças, muito justas, de presilha por debaixo dos sapatos, e o casacão ligeiramente rodado, de plaid escocês” (230). Ao mesmo tempo que tinha um ar aristocrático pelo lado paterno, apresentava também “algo de rebelde e de humilde” (230), características de sabor romântico.

Homem de contradições, João Pinto é ao mesmo tempo bruto, como fica evidente na opinião que tem sobre a ópera no Teatro de São João (234-235), não sendo menos verdade a sua sensibilidade, refletida numa coleção de imagens exóticas e de miniaturas, que revelam a predisposição romântica para o exotismo e o orientalismo. É devido a esse imaginário, de resto, que a personagem acaba por enamorar-se por Joana Maria, aqui associada à figura de “Zenóbia” (231-232).

A personagem vive durante o período da introdução do Romantismo em Portugal, contemporâneo, portanto, das Guerras Liberais. A sua predisposição para a História e para as histórias revela-se no tédio que lhe causam as trivialidades contadas pela esposa, quando, na verdade, João Pinto preferia contar os eventos do Cerco do Porto (253).

É a partir deste momento que a personagem adota a posição de narrador e conta efetivamente não só a história da cidade chuvisquenta, mas também de Portugal e da sua família, desde a guerra sangrenta na Invicta até à morte de D. Maria II. Deste modo, João Pinto de Azevedo Meirelles assume o duplo de narrador e de escritor, num processo en abyme que parece credibilizar a veia romanesca de Mário Cláudio, uma vez que, nos relatos que produz, a personagem apresenta uma grande predisposição para a imaginação criativa.

O romance termina com a figura a observar, em finais de 1853, a cidade do Porto a partir de Vila de Nova de Gaia, ocupando, assim, a Quinta e a Casa das Virtudes, a fons et origo da família de João Pinto de Azevedo Meirelles, visto como o herdeiro natural da casa, recetáculo e, ao mesmo tempo, divulgador da sua história.

 

Referências

Cláudio, Mário (2009). A Quinta das Virtudes. 4ª edição. Lisboa: D. Quixote.

[publicado a 15-05-2024]

José Vieira