Natural de Lisboa, José Júlio dos Santos Nazaré ligou-se desde cedo ao jornalismo, tendo colaborado em vários periódicos (O Civilizador, Conservador, Diário de Notícias, Diário Popular, Jornal de Lisboa, Novidades, A Revolução de Setembro, Teatros de Lisboa) e na revista Gazeta de Portugal, onde Eça de Queirós virá a publicar, sob a forma de folhetins, os textos que compõem o volume Prosas bárbaras. Importa lembrar que muitos destes jornais tinham um ponto em comum: o interesse em divulgar a literatura folhetinesca francesa. Santos Nazaré estreia-se, justamente no campo da tradução, no jornal Conservador. Verte ainda para português L’Homme-Femme de Alexandre Dumas Filho, cujo conteúdo lhe merece algumas considerações pessoais, que deveriam assumir a forma de prefácio à segunda edição do livro, mas que acabam por vir apenas à luz do dia em opúsculo: Problemas e soluções: algumas palavras aos leitores do Homem-Mulher (1873).
Foi também durante algum tempo diretor literário do Almanaque Ilustrado da Empresa Horas Românticas. Apesar desta intensa atividade intelectual, nem por isso ficou mitigado o seu empenhamento cívico: chegou a ser apoiante das “Conferências Democráticas” e, no fim da vida, procurador régio em Macau.
É autor de um só romance, intitulado Eva (1870), que dividiu a crítica, mas que Álvaro Manuel Machado classifica nos seguintes temos: é “um tipo de romance romântico intimista e analítico do género do Werther de Goethe, do Adolphe de Benjamin Constant ou do Raphael de Lamartine" (Machado, 1987: 11).
Eva, a quem Pedro da Silveira (1974: 172) chamou “mulher enigma” suscita uma paixão avassaladora num escultor de nome Gustavo, à qual corresponde, mas com sensatez e calculismo. À jovialidade e sinceridade sentimental do jovem artista contrapõe-se, no entanto, a astúcia da mulher mais velha, bem instalada na vida, e protegida por um casamento seguro. Desta assimetria nasce, então, a matéria que alimenta o romance, contado na primeira pessoa, por quem viveu os acontecimentos e dele extraiu dissabores. Com todos os defeitos e encantos das obras de juventude, Eva leva Pedro da Silveira a reconhecer em Santos Nazaré um pré-realista e um precursor do romance introspetivo em Portugal (Silveira, 1974: 172 e 174). No entanto, há quem insira a obra no período epígono do ultrarromantismo. E é provável que a força que Santos Nazaré atribui à personagem feminina do romance se antecipe ao opúsculo onde defende uma estrutura social mais justa para a mulher. De acordo com o autor, “têm as mulheres, à maneira de pedras preciosas, faces diferentes: variam de cores e aspetos, conforme o lado por onde são observadas. Em Eva todas poderão reconhecer-se, conquanto nenhuma seja ela propriamente” (Nazaré, 1870: 3).
Referências
MACHADO, Álvaro Manuel (1987). “Santos Nazaré e o romantismo português «fin-de-siècle»”. Prefácio a: NAZARÉ, Santos. Eva. Lisboa: Imprensa Nacional Casa da Moeda. 11-26.
NAZARÉ, Santos (1870). Eva. Lisboa: Tipografia Portuguesa.
SILVEIRA, Pedro da (1974). “Um romancista romântico-realista: Santos Nazaré”, in Estética do Romantismo em Portugal [Primeiro Colóquio 1970]. Lisboa: Grémio Literário. 169-174.
Personagem no Dicionário:
Gustavo (Eva)